Entidades questionam constitucionalidade da MP 936

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A MP (Medida Provisória) 936, que possibilita a suspensão dos contratos de trabalho ou a redução das jornadas e salários em função da crise decorrente da pandemia de coronavírus, pode ser votada ainda nesta sexta-feira (3/04) pelo Congresso Nacional.

As Centrais Sindicais se reuniram remotamente nesta quinta-feira (2) e criticaram a MP 936. Os dirigentes também reprovaram as iniciativas adotadas até agora pelo Executivo federal, que privilegiariam o sistema financeiro.

“A resposta do governo, ante à pandemia e a redução da atividade econômica, é tímida, indigesta e extremamente insignificante frente ao montante de recursos disponibilizados para o setor financeiro”, afirmam as Centrais em nota.

Para o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), a medida é insuficiente para proteger o emprego e direitos, e um exemplo grave disso é o item que limita a proteção dos trabalhadores garantindo estabilidade apenas para aqueles que entrarem no programa emergencial. Isso significa que uma empresa pode aderir à redução de jornada e trabalho, mas limitar a medida a uma parte do seu quadro, o que poderá causar a demissão de outros trabalhadores que a empresa decidiu não incluir no programa.

“Os trabalhadores com salário mais baixo, sem qualificação podem ser demitidos mais facilmente porque o custo da demissão é muito mais baixo. A MP, na verdade, desprotege os mais vulneráveis. A estabilidade tem que ser para todo mundo“, avalia a técnica da subseção do Dieese da CUT Nacional, Adriana Marcolino.

Inconstitucionalidade

Para as entidades, os acordos entre trabalhadores e empregadores não podem ser individuais. Os sindicalistas informaram que vão sistematizar propostas a serem levadas ao Congresso e apresentadas como emendas.

“Ressaltamos que a Constituição brasileira garante o acordo coletivo justamente porque no acordo individual o trabalhador sempre sai prejudicado”, afirmam ainda, orientando os empregados a procurar seus Sindicatos.

Qualquer medida deve respeitar o artigo 7º da Constituição, que só permite redução salarial por meio de acordo coletivo, e a participação das entidades sindicais em todas as negociações. Além disso, os salários devem ser mantidos integralmente, “de forma a manter o poder de compra e fomentar uma retomada econômica”. As Centrais propõem ainda 180 dias de estabilidade, prorrogação do Seguro-desemprego e isenção de tarifas.

Procuradores se posicionam contra redução salarial

Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho) e a ANPT (Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho) também publicaram nota pública criticando a possibilidade de efetuar redução de salário e jornada e suspensão de contrato por meio de acordo individual.
Na avaliação da Anamatra,  essa MP tem conteúdo que “afronta” a Constituição e aumenta a insegurança jurídica, além de ser socialmente injusta.

“Em momento de alta fragilidade, pelas incertezas sociais e econômicas, colocar pessoas com medo para negociarem sozinhas não é negociação. Será sempre imposição”, afirma a presidenta da Anamatra, Noemia Porto.

“A expectativa, num cenário de crise, é de que a prioridade das medidas governamentais se dirija aos mais vulneráveis, notadamente aqueles que dependam da própria remuneração para viver e sustentar as suas famílias. Na MP 936 há, contudo, insistência em acordos individuais entre trabalhadores e empregadores”, diz a Nota da Anamatra, citando ainda “distinção” entre trabalhadores, com negociação individual para os considerados “hiper-suficientes”.

A MP prevê que, durante o estado de calamidade pública em razão da pandemia da Covid-19, o empregador poderá acordar com o empregado a redução proporcional da jornada de trabalho e salário, por até 90 dias, sendo preservado o valor do salário-hora de trabalho. Poderão ser feitas reduções de 25%, 50% ou 70%.

O empregado que tiver sua jornada e salário reduzidos terá direito ao Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, custeado com os recursos do Seguro-desemprego. O valor a ser recebido pelo governo vai depender do salário do trabalhador e da porcentagem da redução. Por exemplo, se o salário bruto do trabalhador é R$ 1.500 por mês, e houver redução de 50% no salário e jornada, o salário passa a ser de R$ 750 mensais. É sobre esta base de cálculo que o valor do benefício emergencial será calculado.

Outra possibilidade trazida pela MP 936 é a suspensão temporária do contrato de trabalho, que poderá durar até 60 dias – podendo ser fracionada em dois períodos de 30 dias. Nesta hipótese, a empresa deverá manter os benefícios que o empregado já recebe, e companhias que tiveram receita bruta anual de R$ 4,8 milhões ou mais no ano passado deverão pagar 30% do “salário”, que na verdade será um auxílio sem caráter salarial, sobre o qual não incidem contribuições. Neste caso, a União paga 70%. No caso de empresa com receita inferior, a União pagará 100%.

Tanto a redução salarial e a da jornada, quanto a suspensão do contrato poderão ser feitas mediante acordo individual formal para quem ganha até R$ 3.135,00 ou para quem ganha mais de R$ 12.102,00. Para os trabalhadores cujos salários estiverem entre esses valores, o acordo coletivo é obrigatório.

Para o advogado trabalhista Mauro Menezes, sócio do Mauro Menezes & Advogados, a MP afronta a Constituição. “A Constituição, no artigo 7º, não admite alteração que reduza salário ou jornada sem que haja uma negociação coletiva sindical, ou seja, o Sindicato tem que participar. Toda experiência das relações de trabalho demonstra que não havendo possibilidade de intervenção da entidade sindical, a renúncia a direitos é algo que não deve ser feita individualmente. A Constituição não permite, nem mesmo nas situações de crise, que haja reduções de salários sem que isso seja produto de uma negociação coletiva”, opina.

Fonte: Contraf-CUT